Variedades

    ‘As músicas que escolhi para me preparar para morrer’

    A música pode evocar recordações poderosas e oferecer senso de normalidade para as pessoas que enfrentam doenças ou a morte. É o que procura fazer o ex-DJ Dave Gilmore, que monta uma playlist para enfrentar sua doença terminal.

    O DJ Dave Gilmore passou anos em Londres executando a trilha sonora das noites de outras pessoas em bares e casas noturnas.

    Agora, ele está curando uma playlist totalmente pessoal: as canções que foram importantes para ele na vida e que irão levá-lo a atravessar sua doença terminal.

    A lista inclui November Rain e Sweet Child O’Mine, do Guns N’ RosesApache, dos The Shadows (que inspirou Gilmore a tocar violão) e Comfortably Numb, de Pink Floyd.

    O sucesso de 1980 Will You?, de Hazel O’Connor, é dedicado à sua esposa e mãe dos seus dois filhos. Ode à poderosa tensão que antecede os romances, a canção é conhecida pelo solo de saxofone, um instrumento que Gilmore também aprendeu a tocar.

    “É a nossa música, de quando ficamos juntos”, conta ele ao programa de TV Morning Live, da BBC.

    A música evoca recordações, enquanto sua esposa Kate acrescenta, baixinho: “A luta valeu a pena.”

    Momentos como este enfatizam o poder da música para estabelecer conexões duradouras.

    Seus benefícios terapêuticos são cada vez mais reconhecidos, na assistência paliativa e no final da vida.

    Seu impacto é neurológico e também emocional, segundo a diretora-gerente da campanha Música para a Demência da ONG britânica Fundação Utley, Sarah Metcalfe.

    Imagens da atividade cerebral mostram que a música “ilumina” diversas partes do nosso cérebro. Ela toca simultaneamente centros de sentido físico e emocional.

    “Mesmo se uma parte do cérebro estiver lesionada, ainda é possível ter acesso às outras regiões”, explica ela.

    A organização beneficente britânica Marie Curie pesquisou 1 mil adultos com entes queridos que receberam assistência na fase final da vida.

    Ela concluiu que ouvir música juntos ajudou a criar uma experiência compartilhada que os deixou mais próximos, gerando uma sensação de normalidade e ajudando para que eles pudessem relaxar.

    Kate vivenciou esta experiência pessoalmente. Quando Gilmore voltou para casa, após um longo período internado no hospital, ele estava ansioso e exausto, mas não conseguia dormir.

    Desesperada, ela apelou para a música nativa americana, um dos gêneros preferidos do marido, para relaxar. “E, de repente, este homem agitado e ansioso começou a dormir”, relembra ela.

    A enfermeira Diana Schad, da casa de repouso Marie Curie em Glasgow, na Escócia, tem 19 anos de experiência. E, como também é musicista, ela instalou um piano para uso por pacientes e voluntários.

    Schad afirma que é importante considerar as sensações despertadas pela música.

    “Você precisa sempre se perguntar: É isso que eles gostariam de sentir naquele momento?”, explica ela.

    Como fazer uma boa playlist para cuidados paliativos

    1. Concentre-se nas recordações musicais de 10 a 30 anos de idade, quando são formadas as associações mais fortes.
    2. Inclua canções relacionadas a lugares especiais, significativos e eventos importantes da vida, como a juventude, feriados, romances, primeiras danças e músicas de casamento.
    3. Considere os sentimentos despertados pelas músicas. Eles podem ser tão poderosos quanto as recordações associadas a elas.
    4. Lembre-se de que a música pode trazer recordações, mesmo para pessoas com condições como demência, conectando diversas regiões cerebrais.
    5. Fique atento a conexões musicais inesperadas, como temas de programas de TV ou jingles comerciais, que podem ter significados especiais.

    Fonte: Diretora-gerente da campanha Música para a Demência, Sarah Metcalfe.

    Especialistas concordam que a música pode reduzir a ansiedade e a dor psicológica, mesmo quando a pessoa está inconsciente.

    A professora Sam Nurphy, da Universidade Aberta, no Reino Unido, é especializada em tanatologia, o estudo científico da morte e das práticas associadas.

    “Certamente, existem evidências de que a audição é o último sentido a desaparecer”, explica ela. “Por isso, mesmo quando alguém está inconsciente ou não reage, a música ainda pode chegar até eles.”

    “Ela mantém a pessoa conectada ao ambiente à sua volta, àqueles que ela ama, à sensação de estar vivo e às recordações que eles tiveram.”

    Conforto duradouro

    A música também pode ser útil para os entes queridos, depois da morte de uma pessoa.

    “Acho que é apenas mais uma distração para as pessoas enlutadas por um ente querido”, afirma Murphy. “Mas existe o conforto de saber que eles estão ouvindo algo que o seu ente querido teria ouvido ao longo dos anos.”

    Foi o que ocorreu com Anna-Kay Brocklesby. Seu marido Ian morreu de câncer da próstata, em 2023.

    À medida que a saúde de Ian se deteriorava, compartilhar suas canções favoritas passou a ser uma parte fundamental do mecanismo da família para lidar com a situação. Aquilo passou a ser uma forma de manter o ânimo e permanecer positivo, segundo Brocklesby.

    “Toda manhã ele descia, fazia o chá e tocava Oh, What a Beautiful Morning [‘Oh, que bela manhã’, em tradução livre], do musical Oklahoma“, relembra ela.

    “E cantava alto. Ele usava a música como uma espécie de mentalidade, de que é assim que será o dia de hoje.”

    Eles tocavam canções de Frank Sinatra, Nat King Cole e Elton John, que ofereciam conforto e conexão.

    Dois anos se passaram após a morte de Ian e Anna-Kay Brocklesby ainda encontra conforto nas músicas que eles ouviam juntos.

    “Ele vive conosco de muitas, muitas formas”, afirma ela, “mas a música pode nos levar para um lugar junto de Ian.”

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